As atualizações do ISS: o imposto do Netflix

É comum ouvirmos sobre o quão retrógrado ou mesmo defasado o direito pode ser. Em razão da morosidade do processo legislativo e judicial, as inovações no campo do direito tendem a surgir muito tempo depois do que efetivamente necessário. Entretanto, quando o tema é a incidência de impostos, o tempo do processo legislativo nos parece encurtar de forma significativa.

 

Dentre os impostos que os municípios arrecadam está o Imposto Sobre Prestação de Serviços – ISS, devendo o ente municipal observar as diretrizes da Lei Complementar 116/2003. É na referida lei que encontramos uma lista em que são indicados quais são os serviços prestados que se sujeitam ao tributo.

 

Ocorre que na lista não existia a indicação do serviço de disponibilização online de filmes, imagens, músicas, jogos etc. Destaca-se o acesso a estes serviços por plataformas extremamente populares como Netflix, Spotfy, Steam, Google Play, Apple Store etc, as quais não se sujeitavam ao recolhimento de ISS, por ausência de previsão na lei, nem mesmo sobre o Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços – ICMS.

 

Entretanto, no dia 10/09/2015, foi aprovado na Câmara dos Deputados a alteração da Lei Complementar para incluir na lista a tributação sobre atividades de “processamento, armazenamento ou hospedagem de dados, textos, imagens, vídeos, páginas eletrônicas, aplicativos, sistemas de informação, entre outros formatos, ou congêneres” e “disponibilização de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto em páginas eletrônicas, exceto no caso de jornais, livros e periódicos”.

 

Por certo, ao leitor empresário que se submete ao recolhimento do referido imposto, a nova incidência pode parecer justa, bem como para o mero usuário dos referidos serviços pode parecer indiferente. Entretanto, a modificação da legislação mostra a persistência em um sistema tributário equivocado.

 

A agilidade na aprovação de leis que criam ou aumentam tributos como resposta à crise financeira, em detrimento das morosas normas que abordam a redução de gastos públicos e a mais que devida reforma tributária, prejudica significativamente não as grandes empresas, mas ao cidadão.

 

Um dos principais erros do atual sistema tributário é ter um grande enfoque na tributação sobre o consumo, ou seja, há uma alta tributação sobre a industrialização, venda de mercadorias e prestação de serviços (IPI, ICMS e ISS, respectivamente). Ocorre que estes são os chamados impostos indiretos, ou seja, muito embora as empresas recolham os valores para os cofres públicos, este custo é repassado para o consumidor no preço final da mercadoria. Ou seja, quem de fato paga o imposto é o cidadão, que arcará com o aumento dos valores pagos pelos referidos serviços.

 

A tributação indireta sobre o consumo é extremamente injusta, não apenas por tornar o produto mais caro, prejudicando o ciclo do consumo, mas também por não considerar a riqueza do adquirente. Assim, ao comprar um refrigerante, o pobre trabalhador arcará com exatamente a mesma quantidade de imposto embutido no preço que o grande empresário, diferentemente do imposto direto, como o Imposto sobre a Propriedade Territorial Urbana - IPTU, que considera a capacidade contributiva.

 

Desta feita, mais uma vez, identificamos que o custo da má gestão de nossos representantes é duramente suportado por toda a população. Quanto mais o povo clama por uma reforma tributária, mais nos surge uma contrarreforma.

 

Thiago Perez Rodrigues é advogado tributarista, membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/TO. É mestrando em Direito pela Universidade Católica de Brasília, com ênfase em tributação contemporânea, especialista em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera e possui Extensão Universitária em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas - FGV. Email: thiago@perezrodrigues.adv.br.

 

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