Sesau erra no trato com médicos e não corrige a eterna falta de tudo

Estado ainda não consegue gerir estoque de medicamentos e insumos sem deixar faltar o básico. HGP continua um caos, mas relação com os médicos deteriora enquanto setor privado avança...

Relação Sesau-Médicos não está das melhores
Descrição: Relação Sesau-Médicos não está das melhores Crédito: Bonifácio/T1Notícias

Assisto há semanas o choque entre a gestão feita na Saúde pelo secretário da pasta, Samuel Bonilha, com os médicos da rede pública, tentando entender onde o Estado quer chegar criando a animosidade que está instalada na relação institucional com a categoria.

 

O último capítulo desta novela, que começou com o calote que o Estado aplica ao não pagar os plantões extras dos que ganham no limite do teto constitucional, ou perto dele, é de se lamentar.

 

Falo da portaria baixada para determinar que seis recém-nascidos sejam operados no Hospital e Maternidade Dona Regina. O documento chega depois de uma decisão judicial, provocada pelo Ministério Público, que cumpre seu papel.

 

A vida afinal é o bem mais precioso e deve estar acima de tudo.

 

Não é possível entender, no entanto, a transferência de responsabilidades. Não dá para defender que médicos, ou qualquer outra categoria, trabalhe de graça porque o governo quer, ou porque o governo não encontra maneiras de pagar pelos serviços que o profissional desempenha.

 

Separando o joio do trigo

Qualquer profissional de imprensa razoavelmente informado sabe que existem médicos que não cumprem seus plantões. Gente que faz “gambiarra”, posterga responsabilidades e não honra o diploma. Apurar os casos de plantões forjados é obrigação das autoridades competentes, seja no âmbito da administração pública ou na esfera da investigação policial, para posterior cobrança na justiça daqueles que lesaram o erário.

 

Ponto.

 

Daí a condenar toda uma categoria a ser desmoralizada publicamente, ou fazer campanha contra a imagem de profissionais de rara habilidade e dedicação, como são os mais antigos profissionais médicos de Palmas, é ultrajante. Um acinte. Uma vergonha. Uma injustiça sem tamanho.

 

É o que se vê no tom com que cirurgiões pediatras são tratados no Dona Regina.

 

Parêntese: Pediatria é uma especialidade em declínio. Não dá dinheiro como dá ortopedia, cardiologia e outras especialidades. Um cirurgião pediatra opera – como bem me lembrou uma profissional gabaritada estes dias – com as mãos, bisturi, fios, grampeador. E com a habilidade adquirida ao longo de anos.

 

Como substituir estes profissionais por outros recém-formados? Ou pelos que são convocados via WhatsApp com a promessa de receber por plantões de 24 horas, líquido, R$ 2.800,00 (dois mil e oitocentos reais) com todas as despesas pagas (passagens aéreas, hospedagem)? Um plantão extra custa para o Estado, pagando aos médicos do Tocantins, R$ 1.200,00 (um mil e duzentos reais).

 

Há algo de muito podre na condução desta situação crítica. E o sinal de alerta acende causando estranheza quando o secretário da pasta afirma que custa ao Estado R$ 2.800,00 cada leito mantido na UTI do Dona Regina, enquanto que na rede privada este mesmo leito sai a R$ 2.400,00.

 

Tem que haver muita má gestão envolvida nisto. Afinal, a rede privada precisa de lucro para sobreviver. E no caso do Estado, o hospital está construído, o equipamento adquirido e instalado, os profissionais concursados ou contratados. A saída então é privatizar? Muito conveniente.

 

As crianças sem operar e o caos do HGP

Conversando com um médico – bastante conhecido e sócio de um dos melhores hospitais privados da cidade, por quem tenho muito apreço – ainda no final do ano passado, ouvi dele a solução para o problema do HGP: adquirir leitos na rede privada. Na sua tese, seria uma saída mais barata para o Estado do que construir e equipar novos hospitais. E desafogaria em 30 dias os corredores e tendas do HGP.

 

Os leitos, adquiridos na rede privada e os procedimentos feitos também na rede privada, custariam mais barato e resolveriam o caos do HGP rapidamente.

 

Pois bem. Não aconteceu. Pode ser que esta mudança é que esteja em curso, sem que a gente perceba.

 

Correntes nas redes sociais circulam em grupos convidando médicos para vir ao Tocantins. Uma convida para trabalharem para o próprio governo do Estado. Outra para um grupo privado e com a possibilidade de receber imediatamente após o plantão.

 

Dá o que pensar.

 

Enquanto a solução milagrosa para muitos não chega, o que se vê é que o Estado ainda não tem um sistema de controle de medicamentos, materiais e insumos.

 

Com todo o barulho feito em cima dos recém-nascidos do Dona Regina – e depois de obrigados os médicos por liminar a operarem sem saber quando ou se receberão seus honorários – faltou fio.

 

Aí entra o capítulo da truculência e da falta de tato. Nunca é demais lembrar que o Simed e a categoria são alvo de piadinhas até hoje porque na campanha do ano passado fizeram recepção calorosa a Marcelo Miranda. Tanto que seu adversário não compareceu ao debate com a categoria.

 

As reclamações de desrespeito aos profissionais são muitas e as atitudes partem de gente despreparada que ocupa cargos na gestão pública.

 

De um destes médicos ouvi que deixará de ser prestador de serviços ao governo do Tocantins, porque quem trabalha obrigado por liminar e sem direito a receber, é escravo. Para este, a saída é demitir-se, afinal, não é concursado.

 

Os concursados, por sua vez, estão submetidos a qualquer tipo de ordem, mesmo que arbitrária, para operar aqui ou no Bico do Papagaio, com ou sem condições, sob pena de serem responsabilizados criminalmente.

 

A que ponto chegamos.

 

Para ser médico é preciso cerca de oito anos de formação, residência. Para ser especialista demanda mais tempo, cursos, investimentos. Para lidar com a vida, não temos muitos profissionais habilitados.

 

O governo, com inabilidade, está acuando uma categoria de profissionais pensantes. Onde se pretende chegar com isto?

 

Esta é a pergunta que não quer calar.

 

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