Um Sêneca no chão e muitas dúvidas no ar: bala de prata pode acabar em festim

Libertação dos presos em Goiás ontem, domingo, 21, conclui o capítulo midiático da operação da PC de Goiás em Piracanjuba. Inquérito deve responder as perguntas sobre origem e destino do dinheiro...

Douglas Schimitt: solto desde domingo a noite
Descrição: Douglas Schimitt: solto desde domingo a noite Crédito: Da Web

Já se vão quatro longos dias que numa pista de pouso em Piracanjuba, no interior de Goiás, uma cena de cinema foi protagonizada para ir ilustrar, horas depois, as páginas do portal de notícias G1, da Rede Globo e se tornar notícia no Jornal da Globo, à meia noite da mesma quinta-feira, 18. 

 

Numa rapidez espantosa.

 

De lá para cá o que se viu foi a imprensa do Tocantins correndo atônita e atrasada atrás das informações daquele que até aqui é para ser o grande escândalo desta eleição ao governo: a apreensão de um avião com pouco mais de três quilos de santinhos (menos que um pacote de arroz) e de uma Hillux, onde estavam três homens: Marcus, o motorista, Lucas o amigo que emprestou a conta e Douglas, empresário conhecidíssimo em Palmas por sua ligação com Eduardo Siqueira Campos, candidato a deputado estadual pelo PTB. 

 

Na mochila de Douglas, R$ 504 mil reais, apreendidos pelo Genarc, da Polícia Civil em Goiás. No avião, santinhos do candidato a deputado federal Carlos Gaguim, casados com o candidato a governo, Marcelo Miranda.

 

A notícia e o bombardeio na campanha do PMDB

 

Logo que a notícia se espalhou, começou o bombardeio contra a campanha do candidato a governador Marcelo Miranda, surpreendido pela pergunta feita pela equipe da TV Anhanguera na saída do debate da Fieto, sobre sua ligação com o avião. Coisa que até então pouca gente sabia.

 

Dezenas de perguntas alimentaram o debate sobre o assunto nas redes sociais a partir de então, enquanto na cobertura oficial se sucederam informações desencontradas. 

 

Releases da campanha governista alimentaram as redações nos últimos dias com trechos de depoimentos dos presos. Nenhum foi liberado na íntegra.

 

Logicamente, os trechos que foram à público são os que sustentam a versão divulgada desde o começo pela equipe de policiais que fez a apreensão: a de que a ligação perigosa entre santinhos (no avião) e dinheiro (na mochila portada por Douglas desde que saiu de uma agência da Caixa) comprovaria se tratarem de recursos de caixa dois de campanha.

 

Os policiais são servidores públicos, têm fé pública. Sua versão do que ouviram a princípio, merece crédito. Mas o inquérito, como gosta de dizer um major da PM, é feito de fatos, de provas. Somente elas responderão, ao final, as perguntas sem resposta até agora.

 

A afirmação por exemplo de que este dinheiro era para a campanha de Miranda, e era levado em espécie por que o mesmo está com as contas bloqueadas, dá o que pensar. Mas dinheiro para campanha não pode ser depositado direto na conta do Comitê de Campanha? Esta conta também está bloqueada? Não está.

 

Começaram as dúvidas.

 

Informação furada levou à grande operação

 

Ao T1, no sábado, Douglas contou como foi a prisão. “Eles me batiam na cara lá no aeroporto, no meio de todo mundo, perguntando: cadê a droga, cadê a droga?”

 

Não tinha droga. A informação recebida pela PC era furada. Quem deu? Por que deu? Com que intenção? 

 

Fica evidente que a pista que levou o Genarc ao aeroporto, não saiu de grampo telefônico autorizado. Se fosse, seria fruto de monitoramento a traficantes de verdade e a operação teria sido um sucesso, sob o ponto de vista do objetivo que moveu a polícia. 

 

Mas a rapidez com que a apreensão do dinheiro e dos santinhos foi parar na imprensa nacional ligando Marcelo Miranda ao dinheiro que Douglas afirma ter levantado numa Factoring em Brasília para pagar as suas contas, é explicada pelo próprio empresário: “do aeroporto mesmo os policiais começaram a ligar para a imprensa dizendo que tinham pego material e dinheiro do candidato a governador do PMDB do Tocantins”.

 

E aí as pessoas começaram a se perguntar: O empresário, fiel escudeiro dos Siqueiras nos últimos anos, estava a serviço de Miranda numa atividade ilegal de captar dinheiro para uma campanha na qual acabara de desembarcar? E surpreendido pela polícia confessou isso docemente?

 

A militância peemedebista fez o contraponto e foi às redes sociais divulgar fotos de Douglas com Eduardo Siqueira voando para Ananás e numa reunião do candidato a deputado Walter Jr., a quem Lucas, estudante de engenharia apoia. As de Lucas, ao lado de Eduardo e do governador Sandoval também foram usadas no Facebook.

 

No ar, as versões foram se contrapondo: a de que Douglas estava à serviço de Miranda, a de que Douglas estava à serviço de Eduardo Siqueira e a suspeita de que este enredo de filme de suspense teria sido tramado a partir do monitoramento de Douglas e do vazamento na Caixa Econômica de Piracanjuba, da informação de uma previsão de retirada feita antecipadamente por Lucas, para saque na quinta-feira.

 

É nisto que Douglas demonstra acreditar e afirma em entrevista ao portal: que foi usado para atingir a campanha adversária do governo, num momento de fragilidade financeira sua.

 

Uma suspeita que encontra sentido na quantidade de denúncias anônimas que as polícias civil e federal têm recebido em anos eleitorais apontando dinheiro em carros e casas de candidatos e seus assessores.

 

O avião, a Hillux e o motorista

 

O emaranhado de informações sem confirmação documental que alimentou boa parte do noticiário nos últimos dias começou a ser desembaraçado no final de semana. Era mentira, por exemplo, que a Construtora Alja tivesse dois aviões, um em cada campanha. 

 

O Sêneca, de propriedade do empresário Ronaldo Japiassú estava emprestado, segundo ele próprio disse em entrevista ao T1, a Douglas, que lhe deve R$ 60 mil reais e estava em Goiás em busca de levantar dinheiro para pagar, esta e outras dívidas. O outro avião, um King Air no qual tinha participação, está locado para a campanha do Solidariedade, não se sabe se por Pablo Castelhano -  que não quis falar – ou se pelo empresário Rossini Guimarães.

 

Abre parênteses.

 

Rossini é um dos homens mais ricos do Estado e que ficou conhecido na última eleição por começar doando a Carlos Gaguim e terminar pagando as contas do já governador eleito, Siqueira Campos. Ele que também teve o nome ligado a Delta e a Carlos Cachoeira há dois anos, ficou deprimido segundo contam seus amigos e saiu de circulação depois de ter sido duramente exposto na mídia, para meses após voltar a gerir normalmente seus negócios.

 

Fecha parêntese.

 

Japiassú assegura que nem ele, nem o piloto tinham a menor ideia de que Douglas voltaria na aeronave carregando R$ 504 mil. Disse que soubesse não emprestaria. Douglas se justifica: “Estou pagando pelo erro de portar aquele dinheiro em espécie”, admitiu.

 

A Hillux que também está apreendida é outro enigma. Foi locada pelo PMDB, como chegou a ser publicado? Onde? De quem? Perguntas ainda sem resposta.

 

O motorista também segundo publicações teria deposto que trabalha no comitê do PMDB e estava em Goiânia para buscar a camionete locada. Outro ponto que falta ser esclarecido.

 

Após libertação, história vai virar inquérito

 

A libertação na noite de ontem dos quatro detidos na operação de quinta-feira passada encerra um capítulo da história do avião apreendido: o midiático.

 

Normalmente um inquérito destes tem 30 dias para ser concluído. Nesta fase, caberá à defesa dos inicialmente acusados de formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e crime contra a ordem tributária, comprovar a origem dos recursos e qual seria sua destinação.

 

Pode até ser que seja concluído com maior celeridade, mas terá que responder a todas as pontas soltas e sem resposta convincente, ou documentada, até aqui.

 

O mais engraçado é que, com tanta coisa em jogo, o grande questionamento do fim de semana foi de que forma o T1 Notícias conseguiu entrevistar Douglas Schimitt que estava preso. 

 

No Jornal do Tocantins de domingo, o delegado Ricardo Chueire, de Itumbiara, questiona a entrevista para em seguida ele mesmo levantar uma hipótese para sua questão: a de que existem muitos telefones celulares no presídio e que o preso poderia ter usado um deles.

 

Sobre isso, para tranquilidade dos nossos leitores só me resta dizer: a entrevista foi gravada, a carta está bem guardada e o sigilo da fonte será preservado como nos permite a Constituição Federal.

 

O resto é lenda sobre como aquela que seria a bala de prata para exterminar quem vai na  frente da preferência do eleitor, pode ter se tornado uma grande bala de festim. 

 

O tempo, senhor da verdade e da razão nos mostrará. 

 

Até lá, o mais inocente no jogo político que atire suas pedras. 

 

Nós, aqui, ficamos na tarefa da imprensa, que não é polícia e nem militante partidária: a de buscar todas as versões de um fato. Até que o quebra-cabeças fique claro para o leitor. Este sim, é capaz de tirar suas próprias conclusões.

 

 

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