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Guerra na polícia pode criar a Vazajato do Tocantins e gerar crise de credibilidade

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Saí ontem da coletiva chamada pelo Sinpol para revelar um áudio do delegado Guilherme Rocha -  que tem sido um ícone no combate aos crimes do colarinho branco no Tocantins nos últimos anos – com o ânimo abatido. De lá, rumei para a próxima coletiva, chamada pelo ex-prefeito Carlos Amastha na Casa 40. O clima era de tristeza. Teve choro, teve desabafo e teve promessa de guerra. O choro, de um Carlos, latino americano, sanguíneo, que já se acorrentou na frente da CGU para ser ouvido após uma operação da PF. Emotivo e emocionado. O desabafo de Tiago Andrino, que afirmou ter ouvido várias vezes que seria preso por Guilherme, pela boca do irmão, Felipe Rocha, que disputou e ficou na suplência da vereança no mesmo ano que venceu as eleições: 2016.

 

 

É deste ano que data o áudio em que Guilherme diz ou sugere que santinhos poderiam ser encontrados “embaixo do estepe, do pneu, essas coisas...”.

 

Meu abatimento e sentimento também de tristeza não vem da ingenuidade de achar que o mundo em que habitam policiais e delegados é perfeito, mas da necessidade de acreditar na polícia. Em agentes que efetivamente façam seu trabalho com correção, técnica, ética, presteza.

 

Esperei até tarde num assunto tão grave pelo simples motivo de que há momentos no jornalismo em que não se trata de dar a notícia primeiro, mas de compreender as coisas primeiro e só falar depois. As duas matérias: acusação e defesa do delegado só consegui liberar depois das 23 horas de um dia cansativo e desgastante.

 

Não há nada que esgota mais a gente do que aquilo que abate a nossa fé.

 

Acho que a crise que se desenha na polícia desde que os agentes e dois delegados foram denunciados por supostamente armarem cenas de crime para parecer guerra de gangues rivais, é a mais grave que assisto nos meus mais de 30 anos de Tocantins. Ontem no Twitter, pessoas daqui que moram longe diziam: não estou entendendo nada. É um pedido de “me explica”. Pois vá lá, mais parece um roteiro de “House of Cards” ou “Scandal”, séries americanas que falam dos meandros do poder, mas é a Vazajato do cerrado tocantinense tomando forma.

 

A explicação 

 

O que estamos assistindo tem como pano de fundo uma guerra entre agentes de polícia (quatro dos mais preparados, antigos, e experts em monitoramento, grampo de quadrilhas e combate ao tráfico estão presos) e delegados. Vai muito além de guerra por valorização salarial, onde há uma queixa que considero justa, de agentes por falta de valorização equânime de ganhos.

 

A defesa dos agentes presos, feita pelo advogado Antonio Ianovich Filho, afirma que delegados armaram para os agentes. Que o delegado Cassiano teria vazado a operação em curso pela PF e mandado mensagem a Caleb, um dos agentes que está preso, para que procurassem o delegado da PF que conduzia a operação, se oferecendo para fazer uma “ponte” para que o delta da PF os recebesse. Como prova, apresenta um print de uma conversa de WhatsApp. Desta ida dos agentes a PF teria se originado a prisão deles.

 

Em contrapartida, os agentes começam a revelar áudios que demonstrariam em síntese, pedidos ilegais de armação de flagrantes (como o que apresentam, com laudo pericial atestando que é mesmo do Delegado Guilherme) e práticas como adulteração de relatórios de investigação, abertura de inquéritos baseados em denúncias anônimas, atuação conjunta destes delegados com promotores e juízes próximos a eles, de forma a criar um grupo de “justiceiros” no Tocantins.

 

Em sendo verdade, isso é grave, muito grave. Não só porque fere direitos humanos básicos quais sejam ser ouvido por autoridade imparcial, ser acusado apenas pelo que efetivamente fez, ter direito à defesa e ao devido processo legal. E por outro lado, no caso de criminosos que estão nas ruas, ser julgado e não executado sumariamente.

 

Polícia política?

 

Talvez quem tenha resumido com mais serenidade o caso, seja o hoje deputado federal Tiago Andrino. “A polícia tem todo dever de investigar crimes. Qualquer pessoa pode ser investigada. O que não pode é escolher culpado antes”. Aí está o cerne da questão.

 

Nos últimos anos, o que mais ouvimos é que um grupo de delegados tinha se tornado uma polícia política, com interesse de destruir grupos políticos. O áudio é de 2016, ano em que quem governava era Marcelo Miranda, e o secretário de Segurança era Simoni. Que interesse teria o aparelho governamental em culpabilizar Amastha e Andrino? Segundo o ex-prefeito, Guilherme teria a intenção de prejudica-lo para evitar que vencesse as eleições ao governo do Estado em 2018. Dois anos antes? Antes ainda da criação da Dracma? São perguntas que ficam no ar.

 

De uma coisa não tenho dúvidas, e critiquei nas minhas redes na época: houveram exageros na condução da Operação sobre desvios na Fundesportes. Qual a necessidade por exemplo de contratar um avião particular (custo médio de 120 mil reais), para buscar no RJ, o então vereador Major Negreiros? E impedir que ele viesse num avião comercial, escoltado por um agente de polícia? 

 

Qual a necessidade ou legalidade de, detendo o vereador José do Lago Folha Filho para explicar a origem de um cheque de R$ 10 mil reais que passou na sua conta, mandá-lo para o presídio, obrigá-lo a vestir uniforme de preso, e trazer de volta sob as luzes da TV Anhanguera? Anos depois, o inquérito sequer foi concluído. Mas o vereador sofreu uma depressão, e tem suas imagens usadas indevidamente num verdadeiro espancamento moral, por adversários, até quando ganha uma eleição, como foi o caso recente, na presidência da Câmara de Palmas.

 

A Lavajato fez escola no Tocantins. Moro e Daltan no entanto ultrapassaram os limites impostos pela ética, e pelo dever de cada um dos seus cargos. Espero, mesmo, com toda sinceridade que esta guerra na Polícia não tire a nossa fé nas nossas autoridades policiais. Tenho acompanhado sua luta nos úlimos anos, e como disse, ressalvados os excessos, o combate aos crimes de corrupção na máquina pública são ESSENCIAIS.

 

Mas não pode virar polícia política. O delegado Guilherme Rocha é um homem da lei, duro, dedicado e merece o benefício da dúvida. Poder se explicar, esclarecer, informar e não ser condenado antecipadamente na opinião pública.

 

 

Carlos Amastha tem uma trajetória incrível. Foi um dos melhores prefeitos da história de Palmas. Tem seu estilo, tem seus exageros, mas desde que se candidatou a prefeito, tem sido vítima de muito preconceito, muita armação por enfrentar interesses de uma elite encastelada e poderosa em Palmas. Tem direito de se expressar, de cobrar respostas, de confrontar práticas.

 

E nós, cidadãos comuns, temos o direito a uma polícia íntegra, de boas práticas que combata efetivamente o crime e não pessoas.

 

É nela que não quero perder a fé.

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