Cura gay: reorientação sexual ou renúncia de si?

É importante lembrar que há 27 anos, desde 1990, a homossexualidade deixou de ser considerada uma doença pela Organização Mundial da Saúde

No último dia 15, o juiz Waldemar Cláudio de Carvalho, da 14ª Vara do Distrito Federal, concedeu uma liminar que, na prática, torna legalmente possível que psicólogos ofereçam pseudoterapias de reversão sexual, popularmente chamadas de cura gay.

 

É importante lembrar que há 27 anos, desde 1990, a homossexualidade deixou de ser considerada uma doença pela Organização Mundial da Saúde – OMS. Tem mais, a Resolução 01/99 do Conselho Federal de Psicologia e o Conselho Federal de Medicina também entendem que a homossexualidade não é uma doença. Além disso, tantos outros mecanismos legais impedem no Brasil que grupos, profissionais e pessoas preguem soluções milagrosas ou terapêuticas para “extinguir a homossexualidade”.

 

O termo "opção sexual" foi substituído por "orientação sexual" pelo simples fato de que o gênero pelo qual uma pessoa se sente atraída, seja de forma emocional, sexual ou afetiva, não decorre de uma escolha. Desta forma, submeter uma pessoa a um tratamento para "reorientá-la sexualmente" nada mais é do que ensiná-la a reprimir sua verdadeira essência para que se adeque e se encaixe às exigências de uma sociedade que ainda vê o diferente como algo a ser combatido, escondido ou relegado à guetos. Mas, a meu ver, o que mais assusta não é um Juiz autorizar tal excrescência e sim o pedido ter sido levado ao Judiciário por profissionais da psicologia. Não existe nenhuma evidência científica que demonstre que seja possível mudar a orientação sexual.

 

É inconcebível que um psicólogo aceite submeter uma pessoa a um tratamento para que esta promova uma renúncia de si mesmo, reprima sua essência e instale um permanente e desumano conflito interno entre quem REALMENTE É e quem DEVERIA ou GOSTARIA DE SER diante da sociedade que lhe oprime. O primeiro contato com o preconceito, que muitos homossexuais sofrem, ocorre dentro de casa. Muitos são agredidos física e psicologicamente ainda na infância por aqueles que têm o dever do cuidado. Sim, estou falando de pai e mãe. Então, como ter força para enfrentar a intolerância e o preconceito do mundo se em casa estes também estão presentes e te reprimem. 

 

Em regra, o gay é criado para se enxergar como a pior pessoa do mundo, se olha sabendo exatamente quem é, mas acreditando piamente que não deveria ser. Se mãos não se estendem e as costas se viram, só lhe resta recuar e se adequar ao que a família e a sociedade lhe exigem, promovendo uma verdadeira tortura à alma, muitas vezes apoiado na falsa ideia de que para ser feliz é preciso estar inserido onde a maioria está.

 

Então, se existe algo que precisa de cura não é a sexualidade de cada um, e sim a preocupação e o incômodo que se tem com a sexualidade dos outros. Ao invés de querer reorientar a sexualidade alheia, vamos promover uma reorientação em valores arcaicos que estão enraizados na nossa sociedade e promovem, tão somente, o ódio, a intolerância e o desrespeito.

 

Fabrício Akitaya - Defensor Público e Sub Coordenador do  Núcleo Aplicado das Minorias e Ações Coletivas – NUAmac Palmas

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