Feminismo para que?

A jornalista Jaciara França comenta a realidade das mulheres e o feminismo

Até bem pouco tempo quando via ou ouvia alguma coisa a respeito de feminismo minha tendência era pensar: “feminismo para que?”. Levanto todos os dias de manhã, visto a roupa que eu quero, saio no carro que eu comprei, chefio uma equipe no trabalho e divido as contas com meu marido todo mês. Não está meio velha essa coisa de feminismo? No meu mundo está tudo certo em relação a isso. Tenho os mesmos direitos que qualquer homem e não sinto esse lance de preconceito.

 

Influenciada pelas publicações em redes sociais de uma ex-colega de faculdade com quem sempre tive ótimas conversas, a jornalista Fernanda Alves, comecei a ler alguns textos sobre o tema. De leitura em leitura hoje consigo ver várias respostas quando alguém me pergunta: feminismo pra que? Na compreensão que adquiri até o momento, vejo a opressão de mulheres acontecendo diariamente em três grandes áreas: no comportamento opressor do sexo oposto, na imposição de padrões físicos e na imposição de padrões comportamentais.

 

Uma pesquisa divulgada pelo Instituto Avante Brasil aponta que em dez anos, entre 1996 e 2012, houve um aumento de 22% do número de morte de mulheres por meios violentos no Brasil, sendo que 68,8% dos homicídios são praticados por parceiros de relacionamento. Ainda há os casos de estupro, agressão verbal e psicológica, que não matam, mas oprimem. Homens de comportamento aparentemente normal, mas que praticam a violência contra a mulher porque o sentimento de superioridade e posse sobre o sexo oposto ainda está presente em muitos indivíduos da nossa sociedade.

 

A imposição de padrões físicos também está ai para oprimir. São quase 4 milhões de mulheres no Brasil, de acordo com o Censo 2010. O país é um dos mais miscigenados do mundo com herança genética de índios, europeus e asiáticos. Mesmo sendo tantas mulheres e de origens tão diferentes só existe uma forma de ser bonita – magra, com peitos e bunda grandes. Quem está nesse padrão, ou perto dele, praticamente não nota as demais mulheres que estão sofrendo discriminação diariamente.

 

Entre as lojas de roupas, os tamanhos grandes só são encontrados nas especializadas ou em um cantinho escondido. Nas propagandas, as mulheres fora do padrão aparecem quase que por um sistema de cotas: entre 100 semelhantes, tem uma diferente para empresa poder dizer: fazemos nossa parte. Na vida social as mulheres consideradas diferentes tem que ter o dobro ou triplo da dedicação para serem aceitas, notadas e admiradas. Há as que não conseguem e seguem suas vidas oprimidas e invisíveis enquanto o mundo segue fazendo apologia a um padrão de beleza quase inatingível.

 

Ainda há a falsa liberdade de comportamento. Uma mulher solteira que decide ter a carreira como prioridade é uma “solteirona mal amada”. Uma mulher casada que decide não ter filhos é uma “fria e insensível”. Uma mulher que trabalha fora enquanto o marido cuida da casa e dos filhos é uma “coitada que não conseguiu homem melhor”. Se você é mulher é não escolheu o caminho de fazer faculdade, trabalhar, casar, ter filhos e uma casa para chamar de sua, você poderá ser estereotipadas, criticada e excluída de algumas relações sociais.

 

Houve o momento de lutar pelo voto, houve o momento de lutar pelo trabalho, houve o momento de lutar pela liberdade sexual e muitas conquistas foram alcançadas, mas a opressão masculina, a imposição de padrões físicos e de padrões de comportamento são questões culturais ainda muito fortes. Não é algo distante da nossa realidade. Pelo menos um desses problemas está na minha vida, na sua ou na de alguma mulher perto de você. É sobre isso que o movimento feminista contemporâneo quer tratar.

 

Quando você ouvir a noticia de que a “Marcha das Vadias” vai acontecer na sua cidade, antes de disparar algo como “bando de mulher arruaceiras” lembre-se que se hoje você tem o mínimo de liberdade para fazer escolhas, esse direito foi conquistado por mulheres que se arriscaram, chocaram e motivaram grandes mudanças na sociedade. Se você não quer militar pela causa é seu direito, mas é justo criticar quem decidiu lutar pela mudança de uma realidade que ainda oprime, exclui e mata mulheres. Feminismo para que? Porque a luta nunca acabou.

 

Quer saber mais

Hoje o movimento feminista está presente em políticos do sexo masculino e feminino que lutam pela aprovação de leis que garantam segurança às mulheres. Está presente em instituições que apoiam mulheres vítimas de qualquer tipo de violência. Está presente nas universidades que desenvolvem projetos que promovem a igualdade de gêneros. Está em diversos veículos de comunicação especializados que abordam esses temas a fim de promover discussão na sociedade.

 

Jaciara França é jornalista, atuou em televisão e assessoria de comunicação. Mantem o blog geracaoequilibrio.com.br onde posta artigos sobre temas de interesse das mulheres contemporâneas. 

 

 

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