O momento de Lula

Não sei se o processo que hoje resulta numa condenação é plausível ou eivado de vícios, o que se percebe é que a justiça, sendo cega, deve ser antes de tudo imparcial e julgar sempre conforme os autos

Não escrevo este texto para dizer que o Presidente Lula é inocente, nem para dizer que ele é vítima de uma trama cuja finalidade é inabilitá-lo para que não dispute as próximas eleições. Escrevo para dizer como o vejo nesse momento. Assim, quero falar do momento em que vive o Presidente Lula. Esse petista passou boa parte de sua vida, que hoje conta com 71 anos de idade, envolvido em várias questões políticas, já foi preso, inclusive. Há bem pouco tempo perde sua companheira, também ela sendo processada e morreu sem ser considerada inocente.

 

Não sei se o processo que hoje resulta numa condenação é plausível ou eivado de vícios, o que se percebe é que a justiça, sendo cega, deve ser antes de tudo imparcial e julgar sempre conforme os autos. Todavia, quando o réu é uma pessoa com a história do Presidente Lula, fica evidente que o momento de Lula o condena. Um réu como ele, não pode sair ileso, não pode ser inocentado.

 

Assim, posso dizer que Lula, em quaisquer processos que responda, será sempre considerado culpado. Para uma pessoa como ele não será nunca aludida à presunção de inocência. O crime dele está implícito. Ele roubou, dizem alguns. Outros tem certeza que ele é dono de mil fazendas. Para tantas pessoas, é dele as maiores empresas da agroindústria.

 

Uma pessoa como o Presidente Lula já nasceu condenado, já há uma sentença de morte inerente. A decisão de condená-lo num processo, que pouco importa quem profira a sentença, é um imperativo sua condenação. Lula não poderia nem ter sobrevivido até hoje, é uma audácia que tenha chegado aos 71 anos de idade. O lugar de Lula deveria ser, desde sempre, a favela, o canavial, o roçado, o trabalho braçal, e, porque não, o cárcere.

 

O presidente Lula cometeu o maior dos crimes que uma pessoa pode cometer na sociedade de classes (não seria de castas?): ele se meteu onde não deveria, ele desobedeceu a ordem dos patrões, ele pegou algumas migalhas que sobraram das mesas mais abastadas e deu aos que como ele já eram condenados. Isso é um crime inafiançável. Dizer que o Presidente Lula foi um larápio, que ele recebeu isso ou aquilo, que teve esta ou aquela vantagem, são meramente estampas para ratificar uma condenação que fora decidida quando ele nasceu. Tanto faz a acusação ser esta ou aquela, ele será sempre culpado. Ele sempre foi visto com suspeita. O sistema de justiça (quase todo ele feito de pessoas das classes mais ricas da sociedade) jamais aceitaram (ou aceitariam) ter no governo uma pessoa que não nasceu nas classes mais ricas. Lula não tem nobreza, não tem etiqueta.

 

O momento de Lula é, pois, um momento em que condenados/as estão todos/as que como ele carregam na cara as marcas de sol do trabalho braçal. O recado desta sentença condenatória é uma ratificação aos/às mais pobres: o que resta é aceitar o monturo como lugar social. A sentença proferida pela justiça demonstra como devem ser tratados os que desafiam, os que se rebelam. Serão condenados/as, inapelavelmente. A esperança é que toda vez que existe uma condenação como esta, o sistema se expõe, por isso temos de resistir para que nesta brecha possamos contestar a imparcialidade desta justiça de classe.

 

Para condenar o Presidente Lula o sistema teve de fazer, pelo menos em tese, o rito processual, daí que a resistência não somente poderá reverter a condenação como também poderá fazer ressurgir o espírito de luta, que mesmo com todas as críticas e divergências, ainda é a luta popular que formará uma sociedade mais justa. Esta condenação é um passo arriscado para os donos do poder justamente porque agora eles têm, obrigatoriamente, de garantir a réplica, e, esta, pode vir pela via da resistência e do engajamento político. O momento de Luta é o momento de luta.

 

Adriano Castorino é doutor em Ciências Sociais/ Antropologia, técnico em Assuntos Educacionais e professor da UFT.

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