O SUS, as emendas e o saco sem fundo da saúde no Tocantins

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O Sistema Único de Saúde – SUS, foi uma das bandeiras mais ousadas que o povo brasileiro ousou levantar no processo de redemocratização. Muito além de um espaço de “assistência” o SUS é responsável pelo modelo de civilização e democracia que temos. Distante do direito real, o direito formal consolida-se na vida das pessoas na medida em que usuários e trabalhadores do SUS ocupam espaços de poder. Neste sentindo no diálogo com o parlamento existe um papel do sindicalismo sanitarista, da intelectualidade, de gestores militantes e principalmente dos usuários, fundamental para mover a correlação de forças dos diversos projetos de país e de democracia que estão em disputa. O SUS também caracteriza nosso grau de civilização na medida em que o modelo sanitário amplie acesso aos serviços de saúde, reduza o risco de adoecimento da população e seja capaz de promover felicidade.

 

A aproximação do parlamento ao marco normativo e de gestão do SUS passa a ser um momento de decisão estratégica sobre o financiamento e modelo de organização de serviços de saúde. A Constituição Federal – C.F., de 1989, que criou o SUS e com ele o Estado do Tocantins, permitiu um amplo espectro de saídas e soluções para a efetivação do acesso à saúde como direito real, como é o caso de seu art. 241, que além de autorizar a criação de Consórcios Públicos, autorizou o pouco utilizado “convênio de cooperação” como instrumento de ação consorciada entre os entes, sem a necessidade de criar superestruturas de gestão caras ao poder público como os Consórcios Públicos, neste marco a partir da Lei Municipal Nº. 2.323, DE 12 DE JULHO DE 2017, Palmas ficou autorizada a conveniar ações e serviços públicos de saúde com os demais municípios do Tocantins.

 

Com aproximadamente 300 mil habitantes, Palmas já chegou a ter 800 mil Cartões SUS informados como de residentes na Capital. Aqui a gestão conseguiu estruturar um número importante de serviços próprios e contratualizou com a iniciativa privada por meio de credenciamento uma oferta de serviços de saúde capaz de garantir acesso a população. Em 2017 Palmas destinou aproximadamente R$ 20,00 reais per capita, 6 milhões de reais, de recursos próprios da Prefeitura e R$ 38.884.599,68 de recursos federais. O Estado do Tocantins não participa do financiamento direto dos serviços credenciados e próprios de média e alta complexidade ambulatorial ofertados na Capital. Para a realização de uma “Mamografia de Rastreamento”, a União repassa R$ 45,00 reais, Palmas com recursos próprios complementa aos palmenses 100% do valor, desta maneira com R$ 90,00 a fila deste exame zerou para as palmenses. Para que o mesmo exame seja realizado a uma usuária do SUS do interior, compete ao Estado ou ao município de origem o custeio complementar, a lógica se aplica a todos os procedimentos SUS de média e alta complexidade.

 

Não é novidade que grande parte da demanda assistencial do interior é drenada para as 3 grandes cidades do Tocantins, Palmas, Araguaína e Gurupi. Com destaque para Palmas, que concentra a maior oferta de serviços privados e públicos do Estado. Grande parte dos problemas do Hospital Geral de Palmas – HGP, estão fora dele. Pacientes com condições de saúde de baixa e média complexidade evoluem a estados de deterioração avançada de sua saúde por não terem acessos adequados aos serviços ambulatoriais especializados. No interior do Tocantins o câncer de mama ceifa e mutila a vida de milhares de mulheres por conta do diagnóstico tardio.

 

Em um momento de debate sobre a aplicação de emendas parlamentares é fundamental que os senadores, deputados, prefeitos e gestores entendam essa simples engenharia do processo de financiamento, organização e possibilidades de acesso ao SUS. Um investimento de R$ 30,00 reais per capta, 45 milhões de reais distribuídos a esta finalidade a todos os municípios do Tocantins, permitiria que Palmas ampliasse seu acesso, que a fila ande para os usuários do interior e que as regiões de saúde possam começar a contratualizar regionalmente os serviços de saúde pública com a rede privada e própria. Se a destinação dos recursos for aplicada em “mais do mesmo” o principal recurso terapêutico dos usuários do SUS do interior seguirá sendo a “ambulancioterapia” regulada pela política eleitoral local. Os instrumentos existem, a gestão pública pode dar certo, depende de vontade política, de decisões estruturantes e do compromisso com o projeto de sociedade justa e democrática que representa a materialização do SUS na vida das pessoas.

 

Nésio Fernandes de Medeiros Junior. Médico, ex-Secretário da Saúde de Palmas

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