Quem tem medo do 'arco íris'?

Em uma sociedade predominantemente machista, heteronormativa e “familista”, a educação é um precioso mecanismo de reversão da ordem social. Ordem esta que potencializa padrões, fortalece a dominação dos sujeitos e solidifica a opressão. A homofobia, expressão máxima da violência de gênero e sexualidade, é desumanizadora. Serve ao retrocesso, a normatividade de pensamentos e expressões, ao tradicionalismo que engessa a sociedade plural que necessitamos. A busca por uma ordem social emancipatória, de real liberdade não apenas de existir, mas de se reconhecer e ser reconhecido, bem como a luta contra a violência e a intolerância em todas as instâncias sociais, passa primeiramente pela educação. 

 

Em meu trabalho de conclusão de curso, escrevi sobre "Os pânicos morais de gênero". Um trabalho árduo, no qual debati a tão temida "ideologia de gênero". Dentro de uma perspectiva local, analisei falas, documentos, notas, atas e tantas outras ferramentas na busca por algumas respostas. Mas uma delas continua aberta: "quem tem medo do debate de gênero nas escolas?"

 

É importante relembrar que esta pauta não é novidade nas cadeiras da Câmara de Vereadores de Palmas. Durante a aprovação do Plano Municipal de Educação, houveram discussões acirradas acerca do tema. Vereadores, sobretudo os da “bancada religiosa” fizeram uma forte campanha contra a inclusão da discussão de gênero nas escolas municipais, propondo dezenas de emendas para a não inclusão do mesmo. Conseguiram. O Plano Municipal de Educação de Palmas (2015-2025) foi sancionado pelo então prefeito de Palmas em janeiro de 2016, através da Lei Nº 2.238, de 19 de janeiro de 2016, publicada no Diário Oficial do Município Nº 1.424, de 19 de janeiro de 2016. O documento foi aprovado sem menção a discussão de gênero e diversidade.

 

No início de 2016, o Ministério da Educação (MEC) disponibilizou livros didáticos que faziam menção as novas famílias, bem como a questões de gênero e diversidade. Os livros faziam parte do Programa Escola sem Homofobia, e segundo o MEC, foram distribuídas 128.588.730 obras a 121.574 escolas públicas brasileiras, ficando a critério das instituições a utilização dos materiais.

 

Mais uma vez o legislativo municipal interviu, e após pressões de setores religiosos e bancadas da Câmara Municipal de Vereadores de Palmas, o então prefeito de Palmas instituiu a Medida Provisória Nº 6, de 14 de março de 2016, publicada no Diário Oficial do Munícipio Nº 1.461, que proibiu a utilização de material didático ou paradidático sobre a chamada “ideologia” ou teoria de gênero.

 

A Medida Provisória Nº 6 altera no Anexo Único à Lei n° 2.238, de 19 de janeiro de 2016, na Meta 5, as redações das estratégias 5.24 e 5.26.

 

Apesar da intervenção da OAB-TO e de coletivos de diversidade, como a realização de audiências públicas e veemente repúdio a Medida Provisória nº 6/2016, o Plano Municipal de Educação permaneceu inalterado e a Medida Provisória válida.

 

Após todos estes acontecimentos, mais uma vez nos deparamos com a ação do legislativo municipal no que tange as pautas identitárias. Um vereador de Palmas propôs a mudança do nome de um CMEI (Centro Municipal de Educação Infantil), por considerar que o mesmo fazia “apologia ao homossexualismo”. O nome do Centro? Arco-íris.

 

Em um país onde a homofobia invisibiliza e mata sujeitos diariamente, atitudes como estas nos mostram o quão distante estamos de uma educação laica, emancipadora, igualitária. O preconceito, a violência e a opressão contra a população LGBTI reflete uma sociedade sedimentada através de relações de poder que servem exclusivamente aos que se beneficiam da manutenção de desigualdades sociais e de gênero. Mas isso não parece ser compreensível a quem deveria representar todos os sujeitos sociais, não apenas uma parcela.

 

Concluo com a reflexão de que deve ser no mínimo perturbador servir a estas relações desiguais de poder, quando se é eleito e pago para servir aos interesses das pessoas. De todas as pessoas. Pode-se até tentar apagar o arco-íris, mas impedir a chuva? Jamais!   

 

Alyne Soares Parma é pedagoga pela Universidade Federal do Tocantins (UFT).

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