Realidade local x Regras da FIFA

Em artigo a jornalista Rejane Lopes comenta os altos preços cobrados durante os jogos e destaca que "os governos passam por cima de leis em detrimento dos direitos da população local"...

Queria ter assistido ao jogo de abertura da Copa das Confederações no Estádio Mané Garrincha aqui em Brasília, mas com o valor do ingresso entre R$ 400 e 1.500, resolvi acompanhar só pela TV. No momento,  tenho outras prioridades e não fiz como alguns: dividir em 12X no visa. Esse tipo de competição é para os endinheirados. O país sede obedece e deve seguir as regras impostas pelas todas poderosas entidades privadas que buscam o lucro acima de tudo, nos maiores eventos esportivos mundiais, Federação Internacional de Futebol (FIFA) e Comitê Olímpico Internacional (COI).

Tendo que escolher entre a cruz e o punhal, os governos passam por cima de leis em detrimento dos direitos da população local, para atender as exigências das duas maiores beneficiadas. Por exemplo, nossos ilustres parlamentares, na votação do Estatuto da Juventude, deixaram fazer valer que a cota mínima de ingressos meia-entrada para estudantes não valerá para os eventos da Copa das Confederações, Copa do Mundo de 2014 e para os Jogos Olímpicos de 2016. Dois ou mais contra-argumentaram, mas foram votos vencidos, porque a democracia é a ditadura da maioria. Outro ponto, é a exigência da FIFA que não leva em conta a realidade local, a média de público nos estádios brasileiros é de apenas 15.000. Ela exige capacidade mínima é de 30.000 espectadores. Cuiabá e Manaus serão as cidades prejudicadas porque possuem times de futebol com pouca representação nacional. Pode acontecer por aqui, o mesmo que com as grandes estruturas construídas para o Mundial na África do Sul, em 2010, poucos meses após o evento as megas construções amargaram a falta de público. Para que pudesse acomodar 88.460 pessoas, a reforma do estádio Soccer City, na capital, Joanesburgo, custou R$ 756 milhões. Quatro meses depois, quando a principal liga de futebol sul-africano iniciou a temporada 2010, o Soccer City só sediou uma disputa com o público de apenas 5.000 pessoas.

Entrar na disputa para sediar eventos desse porte é uma decisão política que deve ser muito bem pensada pelos países em desenvolvimento. O investimento do Estado é alto, como não há majoração de tributos, recursos são retirados de outras áreas para cobrir esses gastos em tão pouco tempo.

Uma conta simples, a FIFA espera angariar em torno de R$ 10 Bilhões com a Copa do Mundo de 2014, entre a venda dos direitos de transmissão pela TV, ingressos e marketing gerado em torno do evento, e, investir menos de R$ 1 bilhão no torneio, que negócio da china não?. Com todo esse dinheiro, explora a boa vontade e paixão dos torcedores ao recrutar voluntários e não pagar as pessoas para trabalhar nos locais dos eventos, não lhes garante o direito de assistir ao jogo, mas só participar do clima momentâneo da maior festa futebolística do mundo que acontece em nosso país.

Pelos dados oficiais do governo, os recursos para custear as obras de infraestrutura vão consumir em torno de R$ 33 bilhões, desses 68% sairão dos cofres do Estado, o restante da iniciativa privada. Do total, serão aplicados aproximadamente R$ 12 bilhões em aeroportos, transporte público e hotelaria nas 12 cidades-sedes, principalmente no entorno dos locais de jogos, o restante na reforma dos estádios. Isso para receber, os mais de 600 mil estrangeiros que devem visitar o país e mover o fluxo turístico de 3 milhões de brasileiros. No entanto, a administração destes espaços não ficará com o governo, mas com as empresas privadas que pouco vão investir.

Ontem, na abertura da Copa das Confederações, houve manifestações e vaias por razões opostas. Por  um lado, dentro do estádio, a elite vaiou o governo porque não aguenta ver o poder na mão do Partido dos Trabalhadores e os pobres melhorando de vida nos últimos dez anos. Por outro, fora do estádio, os manifestantes estavam no local porque querem ver a diminuição da pobreza e melhoria ainda mais dos indicadores sociais, principalmente os de educação, saúde e transporte, contudo partir para a agressão é uma maneira de se perder o respeito e alguns direitos.

Rejane Lopes é jornalista e servidora pública federal.
Tocantinense, graduada em jornalismo pela UFT.

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