O mito de Sísifo na PEC, reforça a sina do tocantinense pobre, num Tocantins rico

Soa sabotagem a aprovação de uma Emenda Constitucional de tantos efeitos danosos, num momento de retomada do crescimento do Estado. Pioneiros servem apenas como cortina de fumaça a outros interesses..

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Descrição: Imagem ilustrativa Crédito: Reprodução/Internet

O Tocantins do sonho do tocantinense nativo, goiano nascido no antigo Norte de Goiás, está cada dia mais distante de ser alcançado.

 

Explico. 

 

Se por um lado a arrecadação cresce e os edifícios arranham os céus de Palmas; 

 

Se Araguaína avança com sua economia pujante, que não depende de governo para o comércio e a criação de gado; 

 

Se Gurupi tornou-se uma cidade universitária de elite sulista;

 

Se o Bico do Papagaio cresceu na riqueza das suas terras férteis e do intenso trânsito nas fronteiras ao Norte do Estado... apesar de tudo isto a maioria das famílias tocantinenses seguem pobres.

 

Os dados do IBGE comprovam a realidade que mostra milhares de cidadãos vivendo no sub-emprego, pendurados em programas sociais e com renda inferior a um salário mínimo. Estão aí o Cadastro Único, do sistema de assistência social, e o cadastro dos beneficiários do auxílio emergencial para provar.

 

O Tocantins da poeira suspensa no ar, no início dos anos 90. O Tocantins dos pioneiros, foi traído, depauperado por uma elite política que mais fez para si e para suas famílias, do que para a população que acreditou no sonho, nas três últimas décadas.

 

Sob o argumento de construir grandes obras estruturantes, de empregar as pessoas nas nomeações que encheram os diários oficiais ano após ano, governo após governo, grandes negócios foram feitos. Incontáveis alqueires de terra foram doados, ou desapropriados,  e vendidos a preço de banana.

 

Somos todos - operários da notícia que aqui vivemos desde o início -  testemunhas dos capítulos desta história. Uns mais, outros menos.

 

É por isso que não espanta que a Emenda Constitucional 110 seja mais um instrumento para convalidar atos que -  eivados de vícios jurídicos no nascedouro -  beneficiam a muitos que trabalharam pela sua aprovação. Sob o argumento de que esta é a PEC dos Pioneiros. Chega num momento pré-eleitoral e terá como efeito danoso o desequilíbrio das contas públicas, caso seja implementada sem um questionamento jurídico forte junto ao Supremo.

 

 

É um desplante. Os pioneiros merecem mais do que serem utilizados numa cortina de fumaça: merecem respeito. 

 

Os que comeram poeira. Dormiram em cima de mesas. Moraram em hotéis de madeira malcheirosa, por que retirada verde, para erguer paredes onde ainda eram escassas as lojas de material de construção.

 

É preciso respeitar os que faziam fila para comprar verduras duas vezes por semana no Supermercado do Gordo, depois no Caçulinha. Os que tinham tambores e caixas d’água nas portas de suas casas sem muro, à espera do caminhão Pipa.

 

Os que amargaram anos de luta no antigo corredor da miséria, sudeste tocantinense hoje recuperado economicamente, na divisa com a fronteira agrícola baiana de Luiz Eduardo Magalhães.

 

É vergonhoso até usar, para validar outros interesses, a expectativa dos que sonharam com concurso público, fizeram prova, foram chamados e tomaram posse tendo como o presente o título de pioneiro, valendo pontuação extra que os diferenciava dos demais. E depois perderam seus cargos. Estes, acredito que agiram de boa fé. Atrás da terra prometida, do sonho de começar a vida numa nova cidade, erguida do marco zero.

 

Este concurso público, que teve Edital publicado em 16 de outubro de 1990, no Diário oficial de número 48 do ano II da criação do Estado, foi tornado nulo, integralmente pelo STF. A Constituição Brasileira não permite tratamento desigual no ingresso do serviço público. 

 

E é o princípio constitucional que vai entrar em choque com esta emenda mal escrita -  talvez de propósito - para num texto amplo, ambíguo, prestar-se a muitas coisas. O que corre nos bastidores é que um texto tão esdrúxulo só foi aprovado com folga graças a um grande acordo. Teria sido aquele que garantiu a vitória de Arthur Lira? Corre nos bastidores, que sim.

 

Não interessa quem é governo hoje. Qualquer governo que atingisse um mínimo de equilíbrio fiscal, gritaria para não cumprir esta reintegração. Qualquer dos parlamentares, se estivesse à frente do Executivo, faria as contas antes de votar a Emenda. E quem quer assuma o governo após Mauro Carlesse, herdará esse abacaxi gigante para descascar.

 

O Tocantins de hoje não precisa mais dos milhares de aprovados naquele certame, até por que após a nulidade, foi sucedido por outros para preencher a necessidade de cada ano, de cada época, de cada gestão. Mas precisa dos mil soldados que o concurso da PM vai selecionar para fazer a segurança dos 139 municípios do Estado.

 

Servidores aprovados em outros concursos não questionados, aguardam há oito, dez anos, por progressões nunca recebidas. O Estado perdeu a capacidade de investimento há muito tempo. E só a recuperou agora, em passado bem recente.

 

Muitos dos municípios tocantinenses – mais de 40, fala-se nos bastidores – não tem sequer uma dupla de militares e uma viatura para fazer sua segurança ostensiva.

 

O fato é que, o impacto previsto na folha é suficiente para projetar muito fora do limite prudencial, o gasto com funcionários. Mas a convalidação de atos que envolvem problemas fundiários, criação de cartórios e indicação de tabeliães - e outros atos com vícios e que foram caindo um a um diante da mudança da legislação ou do questionamento em ações judiciais - pode descortinar um cenário bem mais complexo do que o desenquadramento fiscal do Estado.

 

 

Ao que parece, os gastos com pessoal são apenas a ponta do Iceberg. Há dois dias a Procuradoria Geral do Estado levanta as ações judiciais que envolvem questionamento de atos do poder executivo ao longo dos últimos anos.

 

É mais lenha na fervura de um tema, que como disse o ex-presidente da OAB, Ercílio Bezerra, vai gerar muitos, mas muitos embates jurídicos. Para além do bate boca da política local.

 

P.S: O mito de Sísifo conta a história do personagem da mitologia grega do mesmo nome, cujo esforço consistia em empurrar uma grande pedra ladeira acima de uma grande montanha. Toda vez que estava chegando ao pico, ela descia com força irresistível. Sísifo permaneceu neste esforço eternamente. Assim faz igualmente, o tocantinense, nativo ou não. Pioneiro e construtor deste Estado. Carrega nas costas o peso da máquina administrativa e do alto custo da sua classe política (com bem raras exceções). Quando pensa que está vencendo e terá um estado competitivo, com indústria e geração de empregos, capaz de gerar riquezas e dividi-las com seus cidadãos, novamente se vê compelido a empurrar a pedra de novo, rumo ao pico do monte. Triste sina!

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