A crise na Saúde e um erro estratégico, ou: pelos ruins, pagam todos

Governo entra na segunda semana crítica na Saúde, com falhas nos atendimentos de hospitais importantes do Estado. O objetivo é correto em otimizar recursos humanos, mas a estratégia se mostra falha

Hospital de Porto Nacional
Descrição: Hospital de Porto Nacional Crédito: Jornal do Tocantins

A população tocantinense assiste com uma dose de apreensão e outra de indignação o que se passa, dia a dia, com a mais nova crise da Saúde no Estado.

 

Mais nova, por que crises na Saúde são recorrentes nos pouco mais de 30 anos de história do Estado. O governo Mauro Carlesse não é o primeiro a tentar enfrentar uma situação que consome recursos financeiros sem tornar os recursos humanos e materiais suficientes para fazer frente à demanda por atendimento médico hospitalar no Tocantins.

 

Aqui, tornou-se verdadeira a máxima de quanto melhor o atendimento, pior o atendimento.

 

Explico: desde que se tornou referência na região Norte, o HGP sofre do mal de todo grande hospital do SUS: a obrigatoriedade de não recusar pacientes. Por mais lotado que esteja. Quanto mais lotado, portanto, pior o serviço, o que explica a máxima de quanto melhor, pior.

 

A crise que Carlesse enfrenta desde a edição da Portaria 247/2018 demonstra que o governo decidiu enfrentar nos médicos, o inimigo número um para que o atendimento funcione a contento. É um erro. Estratégico.

 

Siqueira lá atrás, também fez o mesmo enfrentamento. Naqueles dias, com a alegação de que ganhavam salários astronômicos, buscou enquadrar os médicos mais antigos, do primeiro concurso, no teto. O que provocou a gritaria geral.

 

Agora, o governo quer, revogando as portarias que flexibilizavam os plantões como forma de cumprir a carga horária, distribuir os médicos que tem na folha de pagamento, pelos hospitais do Estado. O objetivo é perfeitamente compreensível e legal. Mas esbarra numa prática, num hábito que inclui uma série de negociações dentro da própria categoria, quais sejam: a troca e a venda de plantões, que criou práticas mais cômodas para os profissionais, e que não atendem os objetivos do Estado.

 

A crise, que começou com a exoneração dos médicos contratados, lá em janeiro, pecou pela falta de planejamento da Secretaria de Saúde, em antes programar o mínimo de profissionais para dar conta do recado de manter o atendimento de urgência/emergência nos hospitais regionais do Estado.

 

Ao promover as exonerações em massa no mês de janeiro sem desenvolver um plano estratégico na Saúde, o governo colocou na rua, contratados diversos da área de saúde, que seguravam e asseguravam o atendimento. Mesmo com a reversão judicial da medida, nunca mais o atendimento foi normalizado, com sérios prejuízos à população.

 

Com os buracos abertos na escala, o atendimento precarizou. Não é preciso dizer que atendimento precário na Saúde custa vidas.

 

E é ai que o governo -  buscando o objetivo fim adequado, correto, sob o ponto de vista da economia dos recursos públicos – pecou nos meios.

 

Se há médicos adotando práticas ilegais - para receber no final do mês por serviços que não foram prestados -  caberia uma grande auditoria, investigação mesmo, que identificasse os casos e punisse, um a um, com a ajuda do Judiciário. Afinal, saúde é direito inalienável de todos e dever do Estado. O agente público concursado para fazê-lo, que descumprir o objetivo para o qual foi concursado, pode e deve responder por isso.

 

Agindo contra os casos específicos, por maior que fosse seu número, o governo do Estado não teria mexido no vespeiro de colocar toda a categoria contra o governo. Recusando-se a cumprir a escala para a qual foram contratados, médicos concursados incorrem em crime de responsabilidade, como se sabe. Mas como está, é uma guerra difícil de ser vencida por qualquer governo. 

 

Por que recursos existem, e muitos, para quem não quer ceder à estratégia do governo. Nesta quarta de Cinzas, vários hospitais do Estado como Hospital Regional de Porto, o Hospital Infantil do Estado.

 

Se um plantonista adoece, ou alega um impedimento e não vai trabalhar, esse profissional que falta compromete todo o atendimento do hospital. Não deveria ser assim.

 

Falta habilidade para lidar com a situação. E não adianta apenas afirmar que não faltarão médicos e que o atendimento será normalizado, sem que isso ocorra na prática.

 

Num dos grupos de WhatsApp no final de semana, onde o assunto discutido era este, a alegação era de que o governo não paga insalubridade, entre outros direitos. E que, se os médicos forem seguir à risca o que preconiza a lei, vão atender sua cota diária e parar para descanso. O que não permitira suprir toda a demanda que está nos hospitais.

 

Ou seja: é uma guerra que não pode ser vencida.

 

Os melhores tempos de atendimento do HGP, o que deu resultado para melhorar o atendimento, agilizar as cirurgias eletivas que estavam na fila, e bater as metas do Ministério da Saúde, foi um amplo acordo com a classe médica. Em tempo: o governador era Siqueira e a secretária era Vanda Paiva.

 

Talvez haja no passado alguma lição sobre como lidar com uma situação tão controversa e melindrosa. Fazer valer a lei para enquadrar os que a descumprem, sem prejudicar a coletividade.

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